terça-feira, 11 de setembro de 2018

Em memória de João Matos e Silva (1944-2017)




Momento XV (1968)

Revejo-me num espelho sem contorno,
Sem nada.
O mar silencioso dá-me sempre igual
Uma alma inacabada.



Corrente (1972)

Uma corrente é sempre uma constante.
Imensidade ligada de infinito.
esta corrente me prende e perpetua.
Inserto nesse espaço eu sou um elo
da corrente que em mim se continua.



Quando o tempo vier (1976)

Quando o tempo vier
que seja apenas mar.
Que se abram em flor
os rios rasgando o vento.
Quando o tempo vier
(que venha breve)
saiba dizer amor
em vez de guerra
saiba querer
a serra
em vez de mar.
E venha a tempestade
para ficar.



Palavras de Palavras 4 (1986)

Como as palavras se excedem
nas palavras
o silêncio recolhe-se nos lábios.



Memória (1987)

Na memória se encerra nela se abre
o tempo do que foi do que há-de vir.
Que o poema se chame sua chave.


Descobridores (1997)

Foram porém descendo
costa a costa
a terra. E era virgem
a vaga que roçava
languidamente as naus
e as vidas como a dizer
além além além.

E descobriram areais
apenas abraçados a marés ausentes
grandes silêncios o canto
das sereias e o pulsar da terra
adolescente e pura.

Esta gente que partiu ignota
das praias do Restelo à aventura.



Noivado (2003)

Estão de branco as salinas
e noivam assim puras
com a terra.
O mar na despedida
da emoção
tece de espuma grinaldas
deixadas por pudor
sobre as areias.


Obras Publicadas:

Sem Contorno: Poesia, Lisboa, Edições Excelsior, 1968.
Tempo de Mar Ausente, Lisboa, 1972.
Intemporal, 1976.
Cântico Suspenso, Lisboa, Edições Sílex, 1986.
Memória(s), pref. Mário Cláudio, Átrio, 1987.
Marítimo CaminhoSintra, Editorial Tertúlia, 1997.
Intemporal, Antologia (1968-2003), Universitária Editora, 2003.

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